Editorial

Sea Shepherd protesta no Oeste da Austrália contra o abate de tubarões

É tempo do alarmismo acabar

Por Julie Andersen, Diretora da Campanhas pelos Tubarões

Tubarão capturado em rede para tubarões. Foto: Mark Addison

Em resposta a atuais relatos de que funcionários no oeste da Austrália estão para começar a travar uma guerra contra os tubarões, iniciando o abate de qualquer tubarão nadando perto das praias da região, a Sea Shepherd Conservation Society está protestando. O abate de tubarões veio em resposta à morte de cinco surfistas por mordida de tubarão, ao longo do ano passado, nas praias do oeste australiano. Entretanto, com tudo que se sabe sobre os tubarões, incluindo o rápido declínio em seu número, o papel fundamental que eles têm em nossos oceanos, e a pouca ameaça que realmente exercem sobre os humanos no grande esquema das coisas, é difícil imaginar que o conceito arcaico de matar esses animais para nossa “proteção” ainda existe.

Para um país com a Austrália – cujos cidadãos são conhecidos por seu ponto de vista iluminado e equilibrado em relação ao nosso mundo natural – declarar guerra aos tubarões é particularmente inquietante. Funcionários planejam matar qualquer tubarão – inclusive o tubarão branco, protegido e ameaçado – que estiver nadando perto das praias do oeste australiano. A um custo bem maior que $ 6,35 milhões, que o governo australiano está investindo no programa, é absolutamente vergonhoso.

Não se enganem. A Sea Shepherd deseja expressar suas sinceras condolências às famílias das vítimas. Porém, enquanto essas cinco mortes trágicas evocam medos primordiais na sociedade, alimentados por campanha de mídia, nós, como uma comunidade impactada globalmente, precisamos de perspectiva.

Nos últimos 215 anos na Austrália, somente 18 fatalidades relacionadas com tubarões ocorreram – uma média de uma morte a cada período de 12 anos. Nos Estados Unidos, onde a probabilidade de alguém ser mordido é cinco vezes maior, a chance de afogamento é de 1 por 3,5 milhões. A chance de alguém morrer por ataque de tubarão é menor que 1 por 264 milhões. E em 2008, na Austrália, uma pessoa morreu por ataque de tubarão, 315 morreram por afogamento e 694 morreram em acidentes de automóvel.

“Antes de matar os tubarões o governo da Austrália deveria considerar também a situação destes”, diz a diretora da Campanha pelos Tubarões da Sea Shepherd, Julie Andersen. “O governo australiano está exibindo uma ignorância incrível. Tubarões estão em perigo de extinção; mais de 73milhões são mortos a cada ano. Regionalmente, mais de 90% das populações de tubarões – incluindo o branco – foram totalmente dizimadas. Tubarões brancos são protegidos nacional e internacionalmente, e os Estados Unidos estão considerando incluí-los na Lei de Espécies Ameaçadas. Dada a natureza crítica da situação dos tubarões, a Austrália tem sorte de ainda ter tubarões em suas águas”, diz ela.

Julie Andersen acrescenta: “o mundo não pode arcar com a perda de mais tubarões. Gostando ou não deles, nós precisamos de tubarões neste planeta. Como predadores de topo, eles mantêm nossos oceanos saudáveis. Tubarões são um componente crítico em um ecossistema que controla a temperatura e o clima de nosso planeta, fornece alimento para um terço do mundo e gera mais oxigênio do que todas as florestas juntas. Estudos recentes indicam que a eliminação regional de tubarões tem causado efeitos desastrosos, incluindo o colapso da pesca e a morte de recifes de corais. Matem os tubarões e a linda e saudável costa australiana irá se juntar às incontáveis outras zonas mortas do oceano”, afirma.

Julie Andersen continua: “O abate não é somente absolutamente ridículo, como também reforça o medo equivocado e irracional de tubarões de nossa sociedade. Isto por sua vez alimenta uma das maiores questões enfrentadas pela conservação de tubarões: a apatia pública ou até mesmo a repugnância em relação aos tubarões. A imagem criada pela mídia e pelo incentivo ao abate torna difícil, para muita gente, entender porque é importante preservar os tubarões – quanto mais tomar medidas para isso”.

Julie nada com os supostos devoradores de gente. Foto: Paul Wildman

Julie Andersen afirma que existem alternativas à prática arcaica de matar tubarões com redes e palangres, muitas delas foram implantadas com sucesso em outras regiões. Outros métodos de impedimento inofensivos, como corrente elétrica, ligas e produtos químicos também vêm sendo desenvolvidos. Julie Andersen afirma “Se nós podemos colocar um homem na lua, nós certamente podemos determinar um método para garantir que tubarões e humanos coexistam em paz nos domínios dos tubarões. Programas como o Avistadores de Tubarão, na África do Sul, prova que há alternativas viáveis à rede para tubarões e também que educação e conscientização podem ajudar”.

A questão do abate de tubarões não é nova para a Sea Shepherd, que tem lutado para dar um fim às redes de tubarão e outros programas de abate por décadas. Nossa campanha “remova as redes” (remove the nets, em inglês) vem fazendo pressão no governo da África do Sul por mais de quatro anos, reunindo apoio de milhares de pessoas. A Sea Shepherd recentemente também processou o governo de Reunião na França e ganhou – terminando com sucesso o abate ilegal de tubarões anunciado para agosto na reserva marinha.

Nos últimos anos, a pesca de tubarões tem aumentado demais – eliminando uma grande porcentagem das populações de tubarão – e o público tem sido exposto a muitas informações sobre meio ambiente e conservação da biodiversidade, assim como o real comportamento dos tubarões em relação aos seres humanos. E muitos têm ido mais longe, provando que há outros métodos inofensivos de impedimento a tubarões. A necessidade de conservação dos tubarões é um fato estabelecido, como é fato que esses animais são significativamente mal compreendidos, com o risco real de um encontro perigoso sendo infinitesimal.

Os dias de matança de animais por medo acabaram. A Austrália, um país com políticas ambientais alimentadas pela expansão do ecoturismo, deveria estar criando precedentes para o mundo. Num momento em que estamos correndo atrás de nossos recursos naturais a taxas insustentáveis, destruir animais selvagens simplesmente porque somos capazes ou devido a medos irracionais alimentados pela falta de conhecimento não é mais aceitável.

O premiê do oeste da Austrália, Colin Barnett, tem mostrado abertamente que sua responsabilidade como um líder para proteger a essência do estado muito antigo e sagrado que ele governa raramente é considerada. Na altura da luta para proteger James Price Point, vem a ideia ridícula de abater o belo e importante tubarão branco das águas do oeste australiano, demonstrando mais uma vez que os australianos precisam acordar e tomar conhecimento de quem estamos deixando tomar esse tipo de decisão. Isto não é o filme “Tubarão”, onde todos precisam correr e se esconder com medo. Esta é a costa acidentada e linda da Austrália e o medo que as pessoas estão demonstrando em embaraçoso. “Se nós pudéssemos simplesmente tomar a decisão de fazer o mesmo abate no governo”, diz o apoiador da Sea Shepherd de muito tempo, o músico Xavier Rudd. Xavier é também um surfista que não tem medo de dividir a água com tubarões.

Então, em vez de pensar “são apenas peixes”, vamos ter isto em perspectiva: sem os tubarões, os oceanos morrem. E, como diz nosso fundador e capitão, Paul Watson: “Se os oceanos morrerem, nós morremos.” A Sea Shepherd não vai esperar quieta e permitir que o governo da Austrália destrua alguns dos últimos tubarões remanescentes por ignorância e arrogância. Nós forçamos para que a questão fosse abordada na África do Sul e paramos o abate de tubarões na Reserva Marinha de La Reunion. Faremos o mesmo no oeste da Austrália.

Tubarão branco morto na África do Sul com palangre, como o que tem sido proposto. Foto: Sea Shepherd

Traduzido por Drica de Castro, voluntária do Instituto Sea Shepherd Brasil