Por Guilherme Pirá, Guardião da Enseada (SSCS Cove Guardian)
O fim da temporada de caça de golfinhos e pequenas baleias em Taiji, no Japão, traz, novamente, aquele alívio de saber que, pelos próximos 06 (seis) meses, esses magníficos e inteligentes mamíferos aquáticos não serão direcionados para sessões de tortura e morte na praia de Hatajiri.
A temporada 2013/2014 da Operação Paciência Infinita (Operation Infinite Patience) trouxe mídia do mundo inteiro para a matança vergonhosa permitida pelo governo japonês. Algumas celebridades, como Sam Simon (Co-criador do seriado “Os Simpsons”) fizeram questão de se juntar aos Guardiões da Enseada da Sea Shepherd (Cove Guardians) para atrair mais atenção para essa questão. Mas, apesar desse foco em Taiji, desde o início da temporada, no dia 1 de Setembro de 2013, o jogo sujo do governo japonês para manter ativistas pacíficos fora de seu território permaneceu disfarçado.
Em uma tentativa de evitar que alguns de nossos ativistas conseguissem capturar imagens da matança e da violenta seleção de golfinhos para parques marinhos, o governo japonês, simplesmente, impediu que alguns voluntários deixassem o aeroporto, mantendo-os sob interrogatório por várias horas, e colocando-os em um avião de volta para casa, deportando-os.
No meu caso, não consegui nem deixar o Brasil para seguir para mais uma temporada, pois minha solicitação de visto aguardou por uma resposta do governo japonês por mais de 02 (dois) meses, quando o prazo informado pelo Consulado Geral do Japão no Rio de Janeiro era de apenas 02 (dois) DIAS !!! Para completar, fui informado que só devolveriam meu passaporte se eu respondesse a um questionário, que perguntava, dentre outras perguntas sem sentido, se eu poderia fornecer informações sobre outros ativistas da Sea Shepherd, mesmo que eu retirasse minha solicitação de visto. No fim, o funcionário do consulado entendeu que eu já conhecia as regras desse jogo, e, contrário à sua vontade, entregou meu passaporte depois de eu ter lhe dado uma carta explicando o porquê de eu não responder ao questionário. Então, eu me pergunto: será que todo turista que pretende visitar o Japão passa por esse longo processo e interrogatório?
Nas duas vezes que estive no Japão, viajei como voluntário, não recebendo qualquer remuneração, sem desobedecer as leis locais, utilizando visto de turista, e não fiz nada diferente de outros turistas. Apenas tirei fotos, filmei e visitei lugares. Por outro lado, a polícia não me tratava como um turista, apesar do meu visto e do meu comportamento. Eles me filmavam e me vigiavam 24 (vinte e quatro) horas por dia, assim como faziam aos meus companheiros defensores dos oceanos. Apesar de diversas conversas em inglês com autoridades japonesas, quando eram questionados sobre esse tratamento diferenciado que recebíamos, eles sempre fugiam do assunto, chegando ao ponto de dizer que não sabiam falar inglês direito, e por isso não poderiam nos responder. De qualquer maneira, o que mais se ouvia falar era que a matança de golfinhos era uma tradição, e por isso eles nunca iriam parar com essa prática. Em todos os lugares que eu visitei, dentro e fora do Brasil, quando a população local tinha uma tradição, adoravam que os visitantes tirassem fotos como lembrança e divulgação de uma cultura diferente. Então, se a matança de golfinhos e pequenas baleias em Taiji é uma tradição tão forte, quanto os cidadãos locais e o governo japonês dizem, por que evitar que as pessoas tirem fotos e divulguem-nas? Em minha opinião, existem duas respostas que levam para o mesmo caminho:
1) A matança é uma prova de que algo tão cruel ainda existe na sociedade do século XXI, deixando animais tão sencientes quanto nós agonizando e morrendo afogados no próprio sangue, enquanto a água da praia se transforma num vermelho triste, e isso mostra a exploração desenfreada que o Japão faz nos oceanos;
2) O trabalho diário dos Guardiões da Enseada para monitorar quantos golfinhos são capturados, vendidos para parques e mortos para consumo humano mostra que, em 4 (quatro) anos de campanha, existe uma queda nesses números, e a quota não é atingida. Isso pode provar que o trabalho da Sea Shepherd em Taiji tem trazido resultados muito positivos, apesar do número de golfinhos nadando livres nos oceanos estar diminuindo rapidamente. No final, isso também revela a exploração desenfreada que o Japão faz nos oceanos.
Com um histórico de exterminador de espécies, essa exploração permitida pelo governo japonês precisa parar, antes que ela coloque um fim em mais uma peça fundamental para a sobrevivência de ecossistemas marinhos, manchando a imagem de seu povo inteiro, que tem sido pintado com a mesma tinta que os caçadores de golfinhos, apesar das gritantes diferenças entre ambos. E antes de sermos considerados racistas, vale perceber que lutamos, também, contra caçadores de focas no Canadá e na Namíbia, contra pescadores ilegais em Galápagos, no Senegal e no Mar Mediterrâneo, contra assassinos de golfinhos e pequenas baleias nas Ilhas Faroé, contra o governo da Austrália Ocidental que mata tubarões inocentes, e contra molestadores de baleias em enseadas brasileiras. Não é uma questão de preconceito, mas de preocupação com os oceanos e a vida que eles abrigam, afinal estamos prontos para defender, conservar e proteger.