Editorial

Lembranças sombrias da matança de baleias-piloto em Klaksvik

Comentário por Peter Hammarstedt, Primeiro Oficial do Brigitte Bardot

Vítimas da matança em Klaksvik. Foto: Peter Hammarstedt

Vítimas da matança em Klaksvik. Foto: Peter Hammarstedt

Eu lembro de agradecer por não ter uma filmadora. Teria levado dez rolos de filme para capturar uma única imagem de cada baleia-piloto sem vida nas docas de Klaksvik. Enquanto eu caminhava pelo passado de cetáceos mortos, foto após foto, eu era mais tolhido pela morte do que pela magnitude das enormes montanhas verdes que envolvem a segunda maior cidade das Ilhas Faroé. Era quase como se as próprias montanhas, que circundam o porto de pesca de todos os lados, procurassem esconder a matança do resto do mundo.

O número total de baleias-piloto que morreram naquela manhã foi de 236, um grupo inteiro de pequenos cetáceos colocados lado a lado e esticados mais do que eu podia ver. Havia adultos e jovens, e fetos mortos, que tinha sido arrancados do ventre de suas mães, ainda ligados pelo cordão umbilical.

Foi importante para a Sea Shepherd obter essas fotos para o mundo, mas desde então, tem sido ainda mais importante para nós impedir que tal carnificina volte a acontecer. Assim, quando o Brigitte Bardot atracou em Klaksvik, em julho de 2011, quase um ano depois da data exata do massacre que eu tinha testemunhado, era estranho, mas promissor, ver que nas docas não corriam o vermelho do sangue.

Somos impopulares em Klaksvik. A Sea Shepherd manchou reputação internacional da cidade como um lugar cruel, e até mesmo nas Ilhas Faroé, muitos veem a infâmia da matança de Klaksvik com desgosto.

A orgia de sangue durou duas horas. A capacidade da praia em Klaksvik é de segurar apenas 100 baleias-piloto. É habitual que uma vez que a praia esteja cheia, a polícia local ordena que o capataz da matança conduza o restante do grupo para o mar, mas aqui em Klaksvik a matança continuou. Quando as baleias não chegam à praia, os assassinos de baleias das Ilhas Faroé invadem o mar e batem seus soknargul, um gancho de caça cruel, no respiradouro das baleias-piloto. O soknargul, ou grindakrok, como é chamado nas ilhas de Sandoy e Suduroy, está ligado a uma linha que é então usada para puxar a baleia, assustada e em pânico, mais perto do açougue na margem.

O Brigitte Bardot ancorado no porto de Klaksvik. Foto: Simon Ager

O Brigitte Bardot ancorado no porto de Klaksvik. Foto: Simon Ager

Enquanto a matança ocorria no porto de Klaksvik e os baleeiros lutavam para encontrar espaço para as baleias-piloto sobre a areia encharcada com o seu sangue, muitos dos baleeiros rapidamente correram para suas casas, para pegar as ferramentas que tinham sido, em parte, proibidas em 1986. Antes de 1986, o soknargul tinha uma extremidade pontiaguda, uma extremidade agora cega para aplacar a Associação Veterinária das Ilhas Faroé. Ao voltar para a matança esses assassinos utilizavam suas ferramentas, criando pânico entre este grupo de baleias-piloto que tinha nadado juntos há gerações.

Após essas duas impiedosas horas, quando a maré finalmente começou a levar o sangue coagulado de volta para o mar, o grupo, sem um único membro sobrevivente, deu os sinais de uma caça de baleias que foi tudo, menos rápida, misericordiosa, ou sustentável.

As fotos que eu tirei em Klaksvik contam uma história. Cada corte e golpe que marcou as carcaças alinhadas me contaram uma história. Uma baleia-piloto havia sido cortada por seis vezes antes de sua medula espinhal ser finalmente rompida. Quando moradores das Ilhas Faroé me dizem que a morte é rápida, eu penso nela.

Felizmente, a chegada do Brigitte Bardot contou uma história diferente, de uma campanha eficaz, projetada para bloquear e cortar todas as tentativas de uma nova matança para ocorrer. É a Sea Shepherd e a missão do Capitão Paul Watson, para garantir que outro massacre nunca acontecerá de novo, especialmente sob os nossos olhos. Enquanto eu caminhava nas docas de Klaksvik mais uma vez, fui autorizado a ver que as docas estavam vazias. Não houveram mais baleias-piloto mortas, tanto quanto meus olhos puderam ver. Eu só vi o Brigitte Bardot descansando em linhas de ancoragem cruzando o cais, como se estivesse isolando uma cena de crime, dando a entender que aqui, ninguém passará.

 Traduzido por Raquel Soldera, voluntária do ISSB.