Editorial

Lágrimas pela Terra do Sol Nascente

Comentário pelo Capitão Paul Watson

Por Quem os Sinos Dobram
por John Donne

Nenhum homem é uma ilha,
Isolado em si mesmo.
Cada um é um pedaço do continente
Uma parte da terra firme.
Se um torrão de terra for levado pelo mar,
A Europa fica menor.
Assim como se fosse um promontório.
Como se fosse o solar dos teus amigos
Ou o teu próprio.
A morte de cada homem me diminui,
Porque sou parte da humanidade.
Portanto, não me perguntes
Por quem os sinos dobram;
Eles dobram por ti.

A Sea Shepherd Conservation Society, nossos diretores, conselheiros, voluntários em terra, funcionários e equipes dos nossos navios e os oficiais sinceramente desejamos expressar nossa mais profunda preocupação e simpatia para com o povo do Japão, que está sofrendo por um dos piores desastres naturais da história da civilização.

A natureza não tem favoritos, e assim como um terremoto atingiu a Nova Zelândia recentemente, incêndios devastaram a Austrália há dois anos, e um tsunami atingiu a Índia e a Tailândia não faz muito tempo, a mensagem é clara – nós compartilhamos todos os perigos de viver neste planeta água chamado Terra.

Em face de tal perigo das forças da natureza, somos todos iguais.

Tenho ouvido muitas pessoas dizerem que a tragédia do Japão é o karma. As pessoas que dizem tais coisas não entendem o conceito de karma. Esse terremoto no Japão tem base puramente na geografia e geologia.

Eu vivenciei o terremoto de Northridge, na Califórnia, em 1994, e a erupção do Monte St. Helens, em 1980, e eu vi em primeira mão quão terrível e impressionantemente devastadora a força da natureza pode ser.

O que aconteceu no Japão é horrível, e como reagimos a isto revela a integridade de nossos corações.

Quando o terremoto aconteceu, eu sabia que amigos próximos estavam em sério perigo. Scott West e os voluntários da equipe Guardiões da Enseada estavam monitorando os caçadores de golfinhos no cais da cidade de Otsuchi, uma das cidades que foi totalmente destruída pelo tsunami.

Devastação pelo tsunami em Otsuchi

Devastação pelo tsunami em Otsuchi

Nós não soubemos por mais de 40 horas se eles estavam vivos ou mortos. Nosso povo em terra e o cidadão médio do Japão eram iguais em face desta tragédia. O Japão não merecia este desastre, nem ninguém deve implicar com o que eles fizeram.

Graças ao raciocínio rápido e uma compreensão da situação em que estavam, a tripulação da Sea Shepherd dirigiu-se para um terreno elevado, quando viram a descida das águas. Eles fizeram isso, apesar do fato de que do momento do terremoto até o tsunami não houve mais de oito minutos.

Eles passaram uma noite muito fria em uma colina e não tinham escolha a não ser assistir a obliteração total da cidade abaixo deles. Eles viram uma mulher gritar por socorro e foram impotentes para ajudá-la. Eles compartilharam barras de energia e água com uma menina japonesa presa no monte com eles. De manhã, eles caminharam por quilômetros através da devastação, corpos e escombros; encontraram compaixão e preocupação nas pessoas que tinham perdido tudo. Pessoas que ofereceram-lhes comida e o calor do fogo. Nosso povo deixou-lhes cobertores.

Nossa equipe nunca vai esquecer o que viu naquele dia, e nunca vão esquecer as boas pessoas que conheceram e com quem partilham agora uma ligação rara, unidos por experiências além da compreensão de pessoas que não estavam lá.

Os Guardiões da Enseada da Sea Shepherd estavam no Japão desde setembro de 2010, acompanhamento a matança de golfinhos. Foi por acaso que no dia em que chegaram ao norte para investigar o massacre das toninhas de Dall, foi o dia em que se viram em pé no cais antes do assalto iminente e completo do tsunami, quando a Terra desencadeou seu enorme poder.

A Sea Shepherd e os Guardiões da Enseada sabem que as mortes brutais dos golfinhos e botos não refletem o comportamento de todos os japoneses. Os Guardiões não estavam ali para se opor aos japoneses – estavam ali para se opor à matança de golfinhos. As pessoas que matam as baleias e os golfinhos não são as mesmas pessoas que encontraram amontoadas pelos incêndios, no meio dos escombros, pessoas que partilharam a sua dor e o horror do que ocorreu naquele dia.

Enquanto isso, em Taiji, 24 golfinhos foram lançados sobre as rochas pelo tsunami. Os pescadores cruéis que os haviam capturado não fizeram qualquer tentativa de libertá-los ou lhes ajudar depois de terem sido feridos. Depois que o tsunami recuou, os pescadores eram o que eram antes do tsunami – cruéis, indiferentes e insensíveis. E de nenhum modo eles refletiram a compaixão e a inocência das pessoas que os Guardiões da Enseada encontraram em seu calvário no norte.

O Japão merece e continuará a receber o apoio das pessoas boas do mundo, em resposta a esta tragédia, pois foi uma tragédia que tirou a vida de um grande número de pessoas e afetou a vida de um número muito maior.

A Sea Shepherd Conservation Society opõe-se sempre contra os assassinos de baleias e golfinhos, que são japoneses, mas não fazemos e nunca o fizemos contra o povo japonês, assim como nos opomos aos baleeiros da Noruega, mas passamos três dias em busca de três noruegueses que se perderam no Mar de Ross há algumas semanas atrás.

Às vezes, somos separados por diferenças e, por vezes, somos unidos por ideais comuns de respeito e compaixão. A vida é complexa e pode ser trágica, mas também é extremamente bonita e são tragédias como esta que mostram que, de fato, nenhum de nós é uma ilha, e que sim, realmente, quando os sinos dobram por um, eles dobram por todos nós.

Simpatizamos com as famílias das vítimas. Somos gratos ao nosso povo ter sobrevivido a esse desastre e retornado, abalados, mas ilesos. Queremos ver o Japão se recuperar das agressões do terremoto, maremoto, erupção vulcânica, e do derretimento nuclear de três de seus reatores. Pelo que aconteceu no Japão, que aconteceu com outros no passado e vai acontecer com outras pessoas no futuro.

Diante desse desastre, reconhecemos que somos todos terráqueos partilhando os perigos e os tesouros, a dor e as recompensas, e a tristeza e a alegria de estar vivo nesta jóia azul e branca em sua viagem através do espaço.

Lamentamos pelas baleias e golfinhos mortos pelas mãos de algumas pessoas cruéis, e lamentamos pelos milhares de seres humanos desaparecidos e terrivelmente feridos fisicamente, mentalmente e emocionalmente por este desastre natural sem precedentes.

Para o povo japonês – os nossos pensamentos estão com vocês. Esperamos que muitos daqueles que estão declarados desaparecidos sejam encontrados, que as casas sejam reconstruídas, para que as famílias se reunam, e que as pessoas sejam alimentadas e abrigadas, e que os doentes e os feridos sejam atendidos e que, a partir da lama e do desespero, dos restos, e da devastação, que o povo japonês se recupere e vença.

Traduzido por Raquel Soldera, voluntária do ISSB.