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EU SOU SEA SHEPHERD

Um manifesto pelo movimento Sea Shepherd - Guardiões do Mar, por Paul Watson

Por três anos, tive que assistir os dissimulados da Sea Shepherd Global enviarem o mesmo navio ao Oceano Austral, ano após ano, com o mesmo propósito — tirar fotos dos enormes navios de pesca de krill que causam tanto dano ao ecossistema marinho do sul do planeta.

Documentando exatamente o que a Nat Geo e o Greenpeace já haviam documentado em 2018. Quantas fotos mais precisamos para saber o que já sabemos?

E ainda têm a audácia de chamar isso de “Campanha de Defesa da Antártida”, quando não passa de uma excursão fotográfica anual. Não vejo muita defesa acontecendo.

É constrangedor. Um insulto ao legado e aos princípios do movimento Sea Shepherd.

É hora de retomar o que nos foi tomado de forma tão traiçoeira.
Em 1977, fundei a Sea Shepherd Conservation Society baseada no princípio da não-violência agressiva. Essa foi a estratégia que nos serviu por décadas — e que forçou a frota baleeira japonesa a sair do Oceano Austral, acabou com a caça pirata no Atlântico (afundando nove navios baleeiros nesse processo), desmantelou o mercado de focas no Canadá, expôs pescarias ilegais e matanças de golfinhos, impediu a caça pelos Makah, defendeu a biodiversidade nas Galápagos, denunciou as atrocidades contra golfinhos em Taiji (Japão) e nas Ilhas Faroé (Dinamarca), ajudou a acabar com redes de emalhe em alto-mar, entre tantas outras campanhas bem-sucedidas.

Em todos esses cinquenta anos, nunca causamos ferimentos a ninguém, nem sofremos ferimentos graves. Nenhum membro da tripulação da Sea Shepherd foi condenado por crimes graves, mesmo com inúmeras prisões e meses de detenção na Groenlândia, Holanda, Alemanha e Canadá. Nossa política sempre foi prática, funcional e eficaz.

A Sea Shepherd não é apenas minha criação original — ela é minha identidade.
Nunca foi pensada para ser uma organização controlada por uma hierarquia de homens oportunistas. Sempre foi um movimento, composto por entidades nacionais independentes, unidas por um objetivo comum: proteger a vida e a diversidade dos mares.

Tudo mudou em 2022, com a tomada hostil da Sea Shepherd por pessoas que eu havia mentorado por vinte anos. Homens em quem confiava, que registraram marcas e logotipos criados por mim, para tomar posse do que nunca lhes pertenceu.

Em 28 de julho de 2022, escrevi:

“A ‘Nova Direção’ que o Conselho atual da Sea Shepherd EUA decidiu adotar não é um caminho que eu possa, em sã consciência, apoiar ou participar. Não mudei meus objetivos nem minha determinação, e me recuso a aceitar uma abordagem que enfraquece o incrível movimento que construímos ao longo das últimas quatro décadas e meia — um movimento que continua crescendo fora dos Estados Unidos.”

Fui forçado a sair, com meus navios, logotipos, arquivos, lista de apoiadores e ativos confiscados. Mas não entrei em desespero. Recomecei tudo do zero.

Parecia assustador, começar sem nada. Mas logo percebi que tinha tudo o que precisava: a lealdade e o apoio de milhares de pessoas.

Felizmente, não estive sozinho. Lamya Essemlali (Sea Shepherd França) e Nathalie Gil (Sea Shepherd Brasil) optaram por permanecer leais aos nossos objetivos e estratégias originais. Rob Read (Sea Shepherd Reino Unido), para evitar processos dos mesmos homens que articularam o golpe, mudou o nome para Fundação Captain Paul Watson — e agora está pronto para retomar o nome original da Sea Shepherd UK.

Fundamos a Captain Paul Watson Foundation nos EUA, seguida por filiais na Austrália, Alemanha, Espanha, Itália, Irlanda, Polônia, Nova Zelândia e outros países. Usei meu próprio nome para proteger a causa contra novas traições. Mesmo assim, fui ameaçado de processo — diziam que usar meu nome era “concorrência desleal”, por ele estar tão associado à Sea Shepherd.

Eles a chamam de marca. Eu a chamo de ideia. De movimento. E, de certa forma, eles têm razão: meu nome está profundamente ligado à Sea Shepherd no mundo todo.

Após minha saída forçada da SSCS e da Sea Shepherd Global, foi inspirador ver tantas pessoas apaixonadas abandonando esse navio à deriva.

A Sea Shepherd Global jamais foi criada para controlar o movimento. Antes de ser sequestrada por quatro homens egoístas, era apenas uma plataforma de coordenação de campanhas e logística de navios.

A transição tem sido difícil — com a SSCS nos processando nos EUA, e a Sea Shepherd Global nos processando na Europa. Até agora, a Sea Shepherd Global perdeu todas as ações contra mim e contra a Sea Shepherd França, sendo condenada a pagar nossas despesas legais.

Como cofundador do Greenpeace em 1977, levei 25 anos para que deixassem de me associar ao nome. Então não me surpreende que, três anos depois da expulsão da Sea Shepherd Global, ainda seja mundialmente reconhecido como o rosto da Sea Shepherd.

Na conferência da ONU em Nice (UNOC), todas as ONGs e delegações me abordaram como Sea Shepherd. Muitos sequer conheciam a CPWF — o que é compreensível.

A verdade é que minha ligação com o nome Sea Shepherd é permanente. Ninguém pode negar isso.

Durante minha prisão na Groenlândia, algo mudou. Lamya Essemlali e a Sea Shepherd França lançaram uma campanha apaixonada pela minha libertação. Lamya mobilizou crianças, prefeitos, mídia e até o presidente e primeiro-ministro da França.

O governo francês se chocou com a reação pública. Com mais de 1 milhão de assinaturas e uma equipe jurídica pro bono atuando na França e na Dinamarca, o Ministro da Justiça dinamarquês teve que decidir: me entregar ao Japão ou me libertar.

Minha defesa foi organizada pela Sea Shepherd França — o próprio movimento que criei me defendendo. Enquanto isso, a Sea Shepherd Global e a SSCS nada fizeram por mim.

Lamya seguiu nossas táticas originais: expor, dramatizar e atrair atenção internacional sobre os crimes do Japão e da Dinamarca.

Hugo Clément e o coletivo Vakita acompanharam cada audiência no tribunal em Nuuk. Seus esforços transformaram minha prisão em uma nova campanha internacional para denunciar a caça ilegal de baleias.

Fora da França, Cyrill Gutsch e a Parley for the Oceans formaram uma coalizão forte para me apoiar nos EUA e na Dinamarca. No Brasil e no Reino Unido, também houve mobilizações firmes.

A Parley criou a campanha “Arrest me – I stand with Paul”, que viralizou em todas as esferas da sociedade global.

Engajaram governos, lendas do oceano, até o Vaticano — construindo pontes e articulações estratégicas.

Em 17 de dezembro de 2024, um dia após a corte da Groenlândia aprovar minha extradição, o Ministro da Justiça decidiu politicamente me libertar. Voltei à França.

Em 31 de março, no lançamento do evento SOS Ocean antes da conferência da ONU em Paris, o presidente Emmanuel Macron apertou minha mão e disse:

“Você estará sempre seguro na França.”
Contou que o Japão exigiu sua extradição — e garantiu que isso jamais aconteceria.

Em 8 de abril de 2025, graças aos meus advogados William Julié, Jean Tamelet e Emmanuel Jez, a Interpol suspendeu a notificação vermelha japonesa, aguardando revisão final.

Percebi que minha liberdade foi possível graças ao movimento Sea Shepherd.
Mesmo que em muitos países a organização tenha sido corrompida e se voltado contra mim, o movimento sobrevive na França, no Brasil e no Reino Unido — firme em sua filosofia da não-violência agressiva.

Nos últimos três anos, assisti com frustração enquanto os traidores do movimento firmavam parcerias espúrias com corporações como a seguradora Allianz, a empresa de pesca Austral (controlada pela Maruha Dachiro do Japão, antiga Taiyo Whaling Company), políticos africanos corruptos — e, talvez o pior, a empresa de segurança israelense Yamasec, que colocou reservistas das Forças de Defesa de Israel a bordo dos navios Sea Shepherd.

Chega. Não assistirei calado à destruição de nossos princípios fundadores.

A fundação Captain Paul Watson foi uma necessidade legal para continuar o movimento — diante do golpe de ex-colegas que diziam que eu era “muito confrontador”, “muito polêmico”, e um risco à tentativa de rebranding da organização.

Mas o movimento Sea Shepherd e eu somos inseparáveis. E continuarei envolvido com esse movimento que tem sido o rumo da minha vida por cinquenta anos.

Depois da apaixonada campanha da Sea Shepherd França, compreendi: o espírito do movimento Sea Shepherd vive.

E isso significa que pretendo retomar o que criei e reconhecer que, até o dia da minha morte, serei o rosto da Sea Shepherd.

EU SOU SEA SHEPHERD, e centenas de campanhas diretas e confrontos perigosos me deram esse lugar.
Não deixarei os lacaios corporativos que nos traíram vencerem. Eles podem ter virado as costas para mim — mas isso não eleva a Sea Shepherd a algo maior. Pelo contrário, trai sua essência.

Ainda represento a alma do movimento.
Se algo me acontecer, Lamya Essemlali é minha escolha como líder internacional.

No Brasil, especialmente na Amazônia, Nathalie Gil e a Sea Shepherd Brasil são uma força poderosa de ativismo. No Reino Unido, Rob Read mantém firme o CPWF. Na Alemanha, Tom Strerath lidera uma equipe forte.

Precisamos resistir — aos destruidores da vida marinha e aos traidores internos que ameaçam nossa história com processos e mentiras.

Não deixaremos que isolem nosso movimento, que falsifiquem nossa história ou sujem o nome de uma organização corajosa — que já eliminou 90% das operações baleeiras do mundo desde 1977.

A todos que ficaram ao meu lado na Captain Paul Watson Foundation: vamos nos unir à Sea Shepherd França e à Sea Shepherd Brasil, para enfrentar os desafios futuros de proteger a vida no mar.

Com essas três frentes, temos uma base sólida para reconstruir nosso legado e avançar rumo a uma conservação marinha verdadeira — pelos direitos de todos os seres vivos do oceano.

Com sorte, outros grupos da Sea Shepherd que hoje estão acuados por ameaças de processo, encontrarão coragem para se juntar a nós — Alemanha, Itália, Espanha, Austrália, Irlanda, Nova Zelândia. Talvez temam por seus empregos, talvez acreditem no mito de que trabalhar com corporações e governos corruptos é melhor que nossa abordagem de confrontação não violenta. Mas ainda há espaço para eles — desde que estejam livres de amarras com interesses escusos.

Sempre disse: o medo não tem lugar na Sea Shepherd.
E é diante do medo, da hostilidade, da falsidade e da apatia que eu reafirmo:

Eu sou Sea Shepherd. Sempre fui. E serei até o dia da minha morte.

 

QUANDO O OCEANO MORRE, NÓS MORREMOS.

 

Paul Watson

Cofundador do Greenpeace (1972)
Fundador da Sea Shepherd (1977)
Fundador da Fundação Captain Paul Watson (2022)
Diretor atual da Sea Shepherd França e da Sea Shepherd Brasil

 

Foto: Paul Watson na UNOC3, em Nice, França, 2025. Crédito: Thiago Sampaio.