Não existe “jogar fora”: combatendo a falta de gestão de resíduos com o Projeto Ondas Limpas Cidades

Equipe Sea Shepherd Brasil e participantes locais de limpeza realizada em Manacapuru-AM
Gestão de resíduos é um desafio em todo o planeta. No Brasil, infelizmente não é diferente. Temos cerca de 40% dos resíduos sólidos urbanos descartados de forma irregular em quase 3 mil lixões.
2 de março de 2025
por Sea Shepherd Brasil
Gestão de resíduos é um desafio em todo o planeta. No Brasil, infelizmente não é diferente. Temos cerca de 40% dos resíduos sólidos urbanos descartados de forma irregular em quase 3 mil lixões. Apesar da legislação ter estipulado o prazo de encerramento dos lixões para agosto de 2024, o que não aconteceu.
O projeto Ondas Limpas Cidades, da Sea Shepherd Brasil, surgiu em 2022 para promover a sensibilização ambiental sobre o assunto e combater o problema da falta de gestão de resíduos em comunidades e pequenas cidades do Brasil. Assista ao vídeo abaixo para conhecer o projeto:
Nossa relação com os resíduos que produzimos
Antes de abordarmos o tema principal, convido você a observar o ambiente ao seu redor enquanto lê esta matéria. Repare em como os itens presentes foram fabricados e quais materiais provavelmente foram utilizados em sua produção. É provável que esses produtos tenham passado por processos industriais, sido distribuídos para um ponto de venda e, em seguida, comercializados.
Todo processo de produção gera algum tipo de resíduo. Ao consumir esses itens, também geramos resíduos, que podem incluir embalagens plásticas, caixas de papel ou papelão, vidros e resíduos orgânicos, como cascas de frutas e vegetais. Muitas pessoas, ao se depararem com esses resíduos, tendem a descartá-los rapidamente, tratando-os como algo indesejável ou sem valor, frequentemente sem reconhecer a responsabilidade individual que temos sobre o lixo que geramos.
Quando trazemos o assunto da gestão de resíduos para o nosso cotidiano, a situação é evidente: geramos resíduos constantemente, assim como toda a população. Mas para onde vai todo esse material descartado?
Em um cenário ideal, os resíduos deveriam ser separados e coletados e os recicláveis encaminhados para cooperativas que realizam a triagem. Logo, esses materiais seriam vendidos para indústrias que os utilizariam na produção de novos produtos, enquanto os resíduos não recicláveis seriam destinados a aterros sanitários. No entanto, essa realidade ainda está distante para muitos municípios que enfrentam situações precárias em termos de infraestrutura e saneamento básico. A pergunta que permanece é: o que realmente acontece com todo esse resíduo? Para onde ele vai?
Geração de resíduos no Brasil em números: O problema é muito maior do que pensamos
Se você vive em uma área com coleta seletiva, considere-se privilegiado – no Brasil, quase 30% da população ainda não tem acesso a esse serviço. Além disso, 45% dos municípios não possuem sequer uma destinação adequada para todos os resíduos gerados, o que significa que eles são enviados para lixões a céu aberto ou aterros controlados, com impactos ambientais enormes. O Diagnóstico Temático de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos, publicado pelo Ministério das Cidades, mostra que essa porcentagem representa 2.350 cidades onde a falta de saneamento básico coloca em risco a saúde da população e do meio ambiente.
Nessas áreas, a realidade é o uso de lixões, que poluem o solo e as águas, emitem gases prejudiciais ao meio ambiente, contribuem para as mudanças climáticas e comprometem a saúde das pessoas que vivem nas proximidades.
Na ausência de uma gestão de resíduos adequada e da conscientização pública, o resíduo acaba nos rios e córregos, seguindo seu curso até o oceano. A Secretaria Municipal de Limpeza Urbana de Manaus retira, em média, 27 toneladas de resíduos diariamente de córregos, igarapés e rios da cidade.
“Gestão de resíduos é um desafio no Brasil inteiro. Na região Norte do país é ainda mais complexo pela questão logística, viabilidade econômica e operacional. A maioria das cidades descartam os resíduos em lixões, que causam impacto negativo significativo. O consumo de produtos industrializados geram embalagens e, consequentemente, resíduos sem nenhum pensamento ou preocupação com a logística reversa e o retorno adequado desses resíduos ao ciclo produtivo.” comenta Andre Ballesteros, Coordenador de Resíduos da Sea Shepherd Brasil.

Dados que comprovam a era da poluição
Em 2019, a Expedição Silent Amazon, apoiada pela National Geographic e pelo IMDEA Institute, percorreu 1.500 km de rios no Amazonas coletando amostras para identificar possíveis contaminantes nas águas. Os resultados são surpreendentes, mostrando contaminantes variados, incluindo microplásticos, defensivos agrícolas, fármacos, metais pesados e outros compostos industriais.
Então nasceu o Ondas Limpas Cidades
Ao deparar-se com o completo descaso com a gestão de resíduos em pequenos municípios das regiões da Amazônia, a Sea Shepherd Brasil decidiu expandir a atuação da Campanha Ondas Limpas, que trabalha na erradicação ao lixo marinho e na pesquisa científica de contaminação por plásticos na costa brasileira.
Foi então que o Ondas Limpas Cidades ganhou forma para focar em pequenos municípios, que vivem à margem de políticas públicas e acordos setoriais de logística reversa.
Os pequenos municípios, com menos de 50 mil habitantes, são a maioria no descarte inadequado de resíduos, devido à falta de orçamento e, muitas vezes, à familiaridade dos gestores com o tema.
Para iniciar nossa abordagem nessa questão, no ano de 2022 fizemos um diagnóstico em cinco municípios no estado do Amazonas para iniciar um projeto que pudesse ir além da sensibilização, apoiando a implementação de uma gestão adequada de resíduos sólidos. Formalizamos parcerias com escolas, prefeituras e identificamos um operador logístico para viabilizar a coleta seletiva na região, até então inexistente.
Dentre os municípios que avaliamos, nosso projeto piloto foi direcionado para a cidade de Anori, com uma população de 20 mil habitantes, na calha do rio Solimões, onde encontramos a parceria das Secretarias Municipais na implementação do projeto.
Começamos com ações de sensibilização e capacitação de professores e, em 2023, a Secretaria de Educação incluiu a iniciativa educacional da Sea Shepherd Brasil com resíduos no Plano Pedagógico das escolas, com desdobramentos de atividades sobre o tema realizadas no calendário escolar.

Ondas Limpas Cidades no Amazonas
Baseando-se nos três pilares da campanha — conscientização, diagnóstico dos resíduos e articulação com o poder público — conseguimos capacitar mais de 170 professores em parceria com a Secretaria de Educação. Esses professores impactaram cerca de 2.100 alunos da rede pública com atividades focadas na conscientização sobre resíduos sólidos.
Pelo segundo ano consecutivo, o projeto entrou no planejamento pedagógico oficial das escolas e mudanças no comportamento dos alunos já são relatadas pelos professores.
Com um projeto experimental de reciclagem, mais de 6 toneladas de resíduos foram encaminhadas de forma correta, mostrando a viabilidade de se ampliar o projeto para outros pontos na cidade.
“Quando o projeto da Sea Shepherd chega em Anori e nos convida a recolher os resíduos, percebemos a quantidade de poluição na cidade e quantos materiais são descartados com descaso em vias públicas e margens dos rios. A participação das escolas foi essencial para o projeto. Muitos materiais poderiam ser aproveitados com a coleta seletiva.” relata Ivan Lima, Gestor Escolar da Rede Municipal de Anori-AM.
O desafio junto ao poder público esbarra na falta de capacitação e vontade política para lidar com o tema, porém acreditamos que a sensibilização também é uma importante ferramenta para que a população demonstre aos seus gestores a importância do tema para a qualidade de vida nas cidades e que estes entendam a a prioridade e a necessidade de implementar ações que abordem o tema.
Os 3 pilares do Ondas Limpas Cidades
No projeto Ondas Limpas Cidades da Sea Shepherd Brasil, nossa proposta é atuar em 3 pilares:
1) Sensibilização: para criar a mudança de hábito em relação ao descarte de resíduos, começando pela escola, onde realizamos a capacitação de professores e doamos materiais didáticos com aprofundamento teórico e sugestões de atividades para a inclusão do tema de forma mais abrangente no calendário escolar; é nessa etapa que promovemos uma mudança de percepção, tirando o assunto da invisibilidade e engajando as pessoas;
2) Diagnóstico de cadeia de resíduos: mapeando os atores da região para encontrar alternativas que possam dar o descarte correto para resíduos recicláveis e criar um projeto piloto para mostrar a viabilidade operacional, dando à população uma alternativa e um estímulo para fazer o descarte correto dos recicláveis;
3) Articulação com o poder público: pensar junto com as prefeituras dos municípios em formas de ampliar e implementar a coleta seletiva, e a partir disso, influenciar a forma como trabalham a gestão de resíduos na cidade, diminuindo os impactos ambientais do descarte final inadequado no curto prazo.

Um grande potencial de expansão pelo Brasil
Essa experiência possibilitou à Sea Shepherd Brasil criar um modelo a ser replicado em todo o país. Além do interesse já manifestado por outros municípios do Amazonas, em maio de 2024, um novo projeto Ondas Limpas Cidades foi iniciado na cidade de Baía Formosa, no Rio Grande do Norte, em parceria com o Instituto Ítalo Ferreira, com a capacitação dos professores e alunos a respeito da importância da correta gestão de resíduos, atividades educativas regulares, mutirões de limpeza, a implementação de um ponto de entrega voluntária para o descarte dos resíduos da instituição, para que os alunos do Instituto possam trazer os recicláveis de suas casas.
Para que isso fosse possível, o projeto identificou um coletor na região, que 1 vez por mês faz a coleta dos recicláveis, garantindo o retorno dos materiais ao ciclo produtivo e evitando assim o descarte inadequado. Em uma próxima fase do projeto, pretende-se iniciar um diálogo com a gestão pública para entender como essa experiência pode alcançar mais pessoas na cidade e influenciar a forma como o território pensa a gestão de resíduos.
Junte-se à luta pela vida: Contribua com a campanha Ondas Limpas Cidades!
Por isso, convidamos você a se unir a nós na campanha Ondas Limpas e ajudar a fazer a diferença. Contribua para um propósito verdadeiro e fortaleça nossa luta pela conservação marinha. Afinal, um oceano sem vida é um mundo em desequilíbrio, onde a perda da biodiversidade e dos ecossistemas marinhos afeta a saúde do nosso planeta e o bem-estar das futuras gerações.
Para saber mais sobre a campanha e formas de apoiar, acesse nosso site Ondas Limpas Cidades – Sea Shepherd Brasil
