Editorial

Coreia do Sul abandona o seu chamado plano de caça científica, mas as capturas acidentais de baleia continuam

Comentário por Erwin Vermeulen

Baleia Minke no Ártico. Foto: Erwin Vermeulen / Sea Shepherd

Na semana passada, a Coreia do Sul foi elogiada por sua decisão formal de abandonar seus planos de caça “científica”. Uma proposta formal para a caça foi apresentada em 3 de dezembro na Comissão Internacional da Baleia (CIB). A proposta não foi arquivada.

Um clamor internacional se seguiu após a Coreia do Sul revelar seu plano de retomar a caça às baleias na reunião da CIB no Panamá, em julho deste ano. A Coreia do Sul afirmou que usaria uma brecha em uma moratória global que permite o abate de baleias para pesquisa “científica”. O Comissário da Coréia do Sul anunciou que a posição do país é a de não aceitar que as baleias não devem ser mortas ou capturadas. Ele ainda afirmou que a CIB é um fórum para o debate legal (não moral), e que “pregação moral não era apropriada” sobre a questão da caça às baleias.

A Coreia do Sul foi um dos primeiros países a tomar a rota de caça “científica” após a moratória global à caça comercial ser criada em 1986, mas o programa durou apenas uma única temporada. O programa foi abandonado devido à pressão diplomática e de ativistas.

Jangsengpo, agora incorporada à cidade de Ulsan, na região sudeste da Coreia do Sul, é, na aparência, muito parecida com Taiji. Há murais de baleias no mar nas paredes, um ponto de ônibus em forma de cauda de baleia, um festival anual de baleias é realizado, e há um museu baleeiro, com um antigo baleeiro e arpão. Eles amam as grandes baleias da mesma forma o infame Japão. Ao longo da rua, em frente ao porto, há uma longa fila de restaurantes de carne de baleia.

De onde eles tiram a sua carne de baleia, já que a Coreia do Sul não tem caçado baleias desde 1986, quando a caça se tornou ilegal?

Há uma brecha gigante na lei aqui. As vendas domésticas de carne e gordura de baleias Minke protegidas do que eles chamam estoque J são permitidas, se as baleias forem apanhadas “acidentalmente”. Há sinais indicadores de que esses regulamentos encorajam deliberadamente as capturas acidentais, em que as baleias são mortas intencionalmente por redes, ou afogadas por pescadores quando ficam presas em suas redes, “por acidente”.

Em 2009, a Coreia do Sul e o Japão representaram mais de 80% da captura acidental global de grandes baleias. O Earth Island Institute informou que, de acordo com a Guarda Costeira sul-coreana, “mais de 660 baleias foram capturadas por ano, de 2007 a 2009”. Os pesquisadores da Universidade de Duke e da Universidade de St. Andrews, na Escócia, estimam que mais de 300.000 baleias, golfinhos e botos são mortos a cada ano, como resultado de capturas acidentais por redes de deriva, redes de emalhar, na pesca de arrasto, e na pesca com redes de cerco de atum. Isso é quase 1.000 por dia!

A IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais) reconhece as capturas acidentais como uma das maiores ameaças para a sobrevivência dos cetáceos.

Várias espécies de cetáceos estão à beira da extinção por causa das capturas acidentais, como as vaquitas do Golfo da Califórnia (uma espécie rara de toninha), golfinhos Maui da Nova Zelândia e golfinhos Irrawaddy das Filipinas.

O Professor Douglas MacMillan, da Universidade da Escola de Antropologia e Conservação de Kent, disse em pesquisa publicada em janeiro de 2012, que ele acredita que o impacto por pescadores regulares é pequena, “mas “que a ‘brecha’ legal pode ter incentivado a caça ilegal de baleias por gangues de criminosos usando barcos de pesca especialmente adaptados”. Como prova, o Professor MacMillan aponta a queda acentuada dos preços da carne de baleia na Coreia do Sul entre 2006 e 2010, uma época em que as taxas de captura acidental ficaram relativamente estáveis. Ele identifica a importação ilegal do Japão como outra fonte de carne de baleia Minke.

Isto é possível porque a “brecha” de caça às baleias por capturas acidentais é explorada pelo Japão e pela Coreia do Sul. Em 2009, Scott Baker, diretor associado do Instituto de Mamíferos Marinhos da Oregon State University, disse que a análise de DNA da carne de baleia de produtos vendidos no mercado japonês sugere que o número de baleias mortas através desta “captura acidental” pode ser igual ao número de baleias mortas através do programa de caça “científica” do Japão. O estudo constatou que quase 46% dos produtos de baleia minke que foram examinados no mercado japonês se originou a partir de uma população costeira que tem características genéticas distintas, e é protegida por acordos internacionais.

O Japão e a Coreia do Sul são os únicos países que permitem a venda comercial de produtos de animais mortos em “capturas acidentais”. “O grande número de produtos de carne de baleia no mercado sugere que os dois países têm uma enorme quantidade de capturas acidentais”, disse Baker. “A venda dos produtos das capturas acidentais só suporta um lucrativo comércio de carne de baleia em mercados em algumas cidades sul-coreanas costeiras, onde o preço por atacado de uma baleia Minke adulta pode chegar a US$ 100.000. Diante desses incentivos financeiros, você tem que saber quantas dessas baleias são, de fato, mortas intencionalmente”. Outras espécies protegidas de grandes baleias detectadas em pesquisas de mercado incluem baleias jubarte, baleias fin, baleias de Bryde e as criticamente ameaçadas baleias cinzentas ocidentais.

Baleia Minke no Ártico. Foto: Erwin Vermeulen / Sea Shepherd

O que podemos aprender com isso?

– Nós temos que parar as nações tratantes que continuam a caçar baleia, Japão, Islândia e Noruega, para remover o precedente que dá a uma nação como a Coreia do Sul a desculpa “se eles estão autorizados a matar baleias, então por que não nós?”

– O comissário para a CIB da Coreia do Sul fez caso no ano passado que o consumo de carne de baleia em comunidades costeiras como Osong datam da ‘pré-história’. Isso é uma falácia cultural. Só porque uma cultura diz que é certo matar baleias, não torna isso certo, e a alegação de que é historicamente cultural não é uma desculpa válida para continuar ou retomar essa prática. Na verdade, a caça comercial para consumo só ganhou popularidade na Coreia no final no século 19 e, especialmente, durante a colonização japonesa da península, entre 1910 e 1945.

O uso da cultura, religião e tradição, por causa de sua natureza irracional, nunca deve ser permitida como uma desculpa para prejudicar outros seres sencientes.

– O abate do Japão no Pacífico Norte e na Antártida, e a proposta da Coreia do Sul apresentada em julho, são um abuso dos regulamentos. O verdadeiro propósito é fornecer um suprimento de carne de baleia para um número cada vez menor de clientes nostálgicos. “A caça científica é uma conseqüência obsoleta e triste de um documento elaborado há 60 anos”, disse o Comissário de Mônaco da CIB, Frederic Briand. A CIB deve remover ciência letal de seus livros.

– As leis, regulamentos e acordos internacionais para proteger os cetáceos são inúteis sem execução. Especialmente quando há dinheiro a ser ganho pelos pescadores locais e os criminosos. O anúncio de julho na CIB para retomar a caça à baleia é vista por alguns analistas como tendo mais a ver com política interna e economia em um ano eleitoral do que qualquer outra coisa. As forças econômicas e sensibilidades culturais geralmente impedem os governos e os políticos em geral de fazer o que é certo, e os faz sacrificar a ética para o que assegura a (re)eleição, incluindo apaziguar os pescadores e fechar os olhos para irregularidades em suas capturas. Perversidades gananciosas e cultural vão encontrar uma maneira, brechas que as autorizem a existir. As autoridades sul-coreanas ocasionalmente reprimem capturas ilegais. Em 2010, relataram 21 infrações apresentadas na CIB, e novamente 21 em 2011. A maioria destes casos são incorporados de uma forma ou outra de captura ilegal. A captura acidental não é uma batalha muito mais difícil. Nada de carne de baleia deve ser autorizada a acabar no mercado, ponto! Nem caça científica, nem “capturas acidentais” existiriam sem esse incentivo.

– A delegação sul-coreana da CIB disse que a pesquisa letal proposta foi necessária “para a adequada avaliação das populações de baleias”, e que os pescadores da região estão reclamando que a população de baleias está aumentando e comendo o seu peixe. A ciência de verdade mostra algo diferente, algo que chamamos de fatos:

  • As baleias não estão esgotando os peixes dos oceanos, a pesca excessiva por humanos é que está.
  • As baleias não se recuperaram para os números do período pré-caça.
  • A pesquisa letal de baleias é desnecessária.
  • Anos de pesquisa baleeira japonesa não produziu nada de valor para a comunidade científica internacional.

A solução é simples, mas (política) está ausente. Elogiar a Coreia do Sul foi uma atitude prematura. Baleias continuam a morrer através de ações humanas em águas sul-coreanas a cada dia para satisfazer a ganância e os costumes ultrapassados.

Richard Broinowski, Professor Adjunto da Universidade de Sydney e Embaixador da Austrália para a República da Coreia, de 1987 a 1989, fez o seguinte comentário em um artigo de 12 julho de 2012:

“A Sea Shepherd poderia levantara adiante, como eles estão ameaçando fazer, o envio de um navio no Mar do Japão para perseguir baleeiros coreanos. Se o fizerem, os tripulantes poderiam esperar um tratamento mais áspero do que eles experimentaram na Antártida dos japoneses. Os coreanos têm uma frota muito eficiente de cerca de 50 navios de patrulha marítima, e eles não poderiam vir a ser particularmente tolerantes com interferência de quaisquer navios estrangeiros no que eles consideram como seu próprio quintal marítimo”.

Eles podem consideram seu quintal, como outros países fazem, mas no final os mares e oceanos são a casa das baleias, dos peixes, e de todas as criaturas menores, mas definitivamente não é da humanidade. Somos apenas dependentes.

A Sea Shepherd enfrentou dificuldades semelhantes, como descrito pelo professor, e venceu. É só perguntar ao Japão.

Traduzido por Raquel Soldera, voluntária do Instituto Sea Shepherd Brasil