Editorial

O preço que nós pagamos por salvar animais selvagens

Comentário de Alex Cornelissen

Capitão Alex Cornelissen

Há muitos de nós do movimento ambiental que foram detidos e até mesmo encarcerados por proteger a vida. Muitas vezes nosso único crime é ter a audácia de nos colocarmos contra países que estão descaradamente cometendo crimes contra a natureza em favor de suas economias.

Apesar de muitas leis e tratados estarem em vigor para proteger habitats, espécies e a natureza em geral, a aplicação dessas peças da legislação é insuficiente ou mesmo inexistente.

A Sea Shepherd Conservation Society é uma agência de aplicação da lei que defende o direito internacional em alto mar. Fazemos isso legalmente dentro do contexto dos regulamentos aceitos internacionalmente. Estamos fazendo o trabalho que governos ao redor do mundo deveriam fazer, mas parece não terem vontade ou serem incapazes disso. Aparentemente, não é uma prioridade proteger áreas fora de sua jurisdição econômica, já que não há lucro político ou financeiro a curto prazo com esse tipo de ação. É aí que entra a Sea Shepherd.

A maioria dos governos está bem feliz que fazemos isso, já que nossas ações evitam que tenham o problema de enfrentar isso, e ainda eles vêem as mudanças positivas que surgem com nossas intervenções. Exceto, é claro, os países que expomos por violarem leis internacionais. Eles estão dispostos a tudo para nos deter.

O que estamos experimentando agora com o Capitão Watson é uma clara tentativa do governo de uma nação de impedir pessoas e/ou organizações que têm exposto suas atividades ilegais. Está, agora, claro como cristal que o governo japonês é responsável pelas tentativas de extradição do Capitão Watson para a Costa Rica e, sem dúvida, de lá para o Japão.

Vamos encarar esta. A Costa Rica tinha há tempos esquecido-se de um caso no qual caçadores de tubarão previamente condenados (o mesmo barco e tripulação foram detidos por pesca ilegal nas Ilhas Galápagos em 2001), acusaram o Capitão Watson de alegadamente ser responsável por alguém ter escorregado e quebrado o dedo. O incidente em questão remonta a abril de 2002, mas o caso nunca foi realmente procurado, até que a presidente Chinchilla, da Costa Rica, fez uma visita ao Japão no final de 2011.

Parece que irritamos o governo japonês. Ótimo. Eu posso garantir que vamos irritá-lo muito mais quando pararmos a frota baleeira japonesa pelo terceiro ano consecutivo, durante nossa próxima campanha, Operação Tolerância Zero, porque isso nós IREMOS fazer.

A Sea Shepherd tem enfrentado inúmeras tentativas ao longo dos anos de governos tentando nos intimidar, ou tentando nos impedir de defender nossos oceanos.

Falando apenas de minha experiência pessoal:

Novembro de 2003: detido em Taiji, no Japão, junto com Allison Lance, por libertar 15 golfinhos da morte certa na enseada.

Acusado de: interferir no comércio.

Após a detenção, fomos intimidados e ameaçados com longas penas de prisão. Por 23 dias a polícia japonesa tentou fazer com que testemunhássemos contra o Capitão Watson e a Sea Shepherd, mas nós simplesmente assumimos total responsabilidade por nossas ações e acabamos liberados após pagarmos fiança de 8 mil dólares.

O que se seguiu foi o conhecimento mundial do pequeno e sujo segredo de Taiji, destacado pelo documentário ganhador do Oscar, The Cove (A Enseada).

Obviamente, desde então, a enseada em Taiji tornou-se arena de tentativas cada vez mais hostis por parte do governo japonês, da direita nacionalista e pescadores gananciosos contra nossos Guardiões da Enseada.

Na última temporada, o Guardião da Enseada Erwin Vermeulen, da Holanda, foi preso por supostamente ter empurrado um treinador de golfinhos. Por meses ele foi ameaçado e intimidado a assumir ser culpado de agressão física. Obviamente Erwin manteve-se firme e se recusou a admitir as acusações fabricadas e suportou o tempo na prisão sem se incomodar com as ameaças.

Nossa luta em Taiji está se intensificando, mas é claro que estamos lenta e constantemente ganhando terreno. Estamos agora ganhando uma crescente atenção internacional, levando a protestos crescentes e indignação pública. Estamos mirando na indústria de golfinhos em cativeiro. Ela é responsável pela demanda que sustenta operações de caça como em Taiji. Também sob investigação estão as companhias aéreas que oferecem transporte aos golfinhos capturados. Mas o mais importante é que o público japonês está ficando ciente do que ocorre na enseada assassina, e a resistência dentro do Japão está crescendo.

Março de 2005: preso com dez outros ativistas durante a Campanha pelas Focas no leste do Canadá. O governo canadense estava cada vez mais hostil e frustrado pelo nossa presença durante o abate anual de filhotes de foca.

Acusado de: testemunhar o abate de filhotes de foca sem ter a autorização requerida (Ação de Proteção à Foca, que na verdade é uma violação do direito humano básico, liberdade de ir e vir).

Apesar do fato de antes da prisão alguns de nós terem sido atacados pelos caçadores de focas, nenhum deles jamais foi acusado, pois nossa presença havia invocado a violência.

Nossas imagens dos filhotes sendo brutalmente massacrados pelos, citando o Capitão Watson, carregadores de porretes, trogloditas, macacos fumadores de cigarros, foram suficientes para mostrar ao mundo que a caça, que muitos acreditavam pertencer ao passado, está ainda muito viva.

Abril de 2006: em minha primeira ação como um capitão da Sea Shepherd, levei nosso navio, o Farley Mowat, do porto da Cidade do Cabo, na África do Sul. Nosso navio esteve amarrado por quatro meses após nossa segunda campanha na Antártica contra os caçadores de baleias japoneses. A embarcação estava mantida num “ardil 22” e negociações com autoridades africanas não estavam indo a lugar nenhum.

Em vez de perder tempo e dinheiro lutando contra uma tentativa politicamente motivada para frear nossos esforços contra a caça ilegal de baleias japonesa, nós simplesmente partimos.

Posteriormente, nós adquirimos um novo navio (o agora Steve Irwin) e retornamos para a terceira e para a mais bem-sucedida campanha contra a caça ilegal japonesa.

Abril de 2008: detido novamente, agora junto com o chefe de operações Peter Hammarstedt, durante a Campanha pelas Focas no leste do Canadá. Mais uma vez nossa presença estava causando sérios problemas para a imagem do governo do Canadá.

Acusado de: testemunhar o abate de filhotes de foca sem ter a autorização requerida.

Desta vez entrou a bordo de nosso navio uma unidade tática armada da polícia real montada do Canadá. A entrada foi tão forçada que o pensamento de alguém ser ferido ou até pior era bem real. Imaginem, estávamos apenas fotografando, mas havia claramente mais semelhanças com zonas de guerra do que apenas o sangue no gelo.

Apesar de todos os esforços para continuar esse massacre subsidiado e de evitar que o mundo saiba o que realmente acontece durante a primavera no leste do Canadá, a Sea Shepherd fez uma grande contribuição para acabar com a caça. Em 2008 a Europa proibiu a importação de produtos de foca (pele, óleo, etc) efetivamente, acabando com o mercado. O governo canadense continuou a determinar cotas ridículas, mas a taxa de mortalidade real está caindo rapidamente. Sem dúvida, em breve, os subsídios sozinhos não serão capazes de cobrir os custos.

O Capitão Watson fez um sacrifício. Seus esforços para respeitar a legislação internacional irritaram o governo de um país que presume estar acima da lei. Ele continua firme na ideia de que a Sea Shepherd deve defender as espécies que precisam de nossa proteção, apesar de ter tido de enfrentar obstáculos aparentemente impossíveis. Depois de tudo, o que podemos fazer contra um governo tão poderoso como o do Japão? Na verdade, podemos fazer muito. Nossa história mostra que TEMOS enfrentado adversários aparentemente invencíveis e TEMOS saído vencedores.

O governo japonês e corporações como a ICR e a Fish & Fish podem continuar atirando casos de ações judiciais estratégicas contra participação pública contra nós, mas NÃO seremos intimidados, censurados ou silenciados. Pelo contrário, isto tem apenas aprofundado nossa determinação. Está muito claro que o governo japonês está preocupado, muito preocupado com o quanto efetivos nos tornamos.

Pode parecer que um alerta vermelho é um sério obstáculo para o Capitão Watson e a Sea Shepherd, mas a justiça vai prevalecer. O Capitão Watson é alguém que se sacrificou e ao mesmo tempo realizou muito. Ele dedicou sua vida para salvar nossos oceanos com honestidade e lealdade inabaláveis. Ele sabe melhor que qualquer um que essa luta não é sobre nós. Não é sobre quem nós somos e o que fazemos. É sobre a vida selvagem que salvamos e as espécies e ecossistemas que protegemos. Simplificando, é uma luta pela própria sobrevivência da vida neste planeta. O Capitão Watson implantou essas crenças nas mentes e corações de muitos de nós. Como nosso exército de voluntários e apoiadores continua a crescer, cada governo de cada nação vai perceber que a força e determinação das pessoas estão do nosso lado.

Traduzido por Drica de Castro, voluntária do Instituto Sea Shepherd Brasil