Editorial

Contemplando o golfinho-de-risso na véspera do massacre anual

Comentário de Erwin Vermeulen

Golfinhos-de-risso antes do massacre...

O massacre anual de golfinhos em Taiji está marcado para começar em 1° de setembro. Quando olho para trás, para o tempo que já passei em Taiji, não dói o sentimento da injustiça de meu aprisionamento, mas o da injustiça feita ao golfinho-de-risso.

Em meus mais de vinte anos no mar, nunca vi um de perto. Em Taiji, os vi toda semana e, durantes algumas semanas terríveis, todos os dias. Terríveis, pois não eram animais brincando na natureza, buscando comida ou interagindo uns com os outros em suas estruturas sociais complexas, mas animais mortos de medo, fugindo por suas vidas. Fugindo em vão, pois não importa o quanto esses golfinhos sejam inteligentes, eles não conseguem fazer frente a 12 altamente manobráveis barcos movidos a diesel, empurrando-os com um muro de som feito de ruído de motor e de homens martelando varas de aço, até um labirinto de ilhotas naturais e rochosas ao longo da costa até que não houvesse mais para onde ir. As redes fecham-se por trás deles. Esta é a enseada da morte.

A beleza está nos olhos do observador, dizem. O golfinho-de-risso é lindo para mim, com sua cabeça em forma de melão e seus corpos pálidos cheios de marcas. Mesmo sem bico, há um esboço do amaldiçoado sorriso do golfinho. Além da idade, a beleza é o critério de seleção para os corretores de golfinhos que chegam, quando o encurralamento termina e os golfinhos são colocados em fila, encalhados na areia, num mercado de escravos coberto por uma lona. A lona serve para esconder o que acontece dos voluntários da Sea Shepherd que estão na colina. Os Guardiões da Enseada, que se importam profundamente com as vidas e os destinos desses animais. Somos os últimos a ver esses golfinhos, antes que sua morte, ou vida em cativeiro como escravos. Embora não possamos ver o ato final, conseguimos ouvir.

Quando os tratadores dos campos de concentração de mamíferos marinhos em Taiji já selecionaram algumas poucas almas para a vida de escravidão, eles estão condenando o resto do grupo à morte e o massacre começa. Podemos ouvir o bater das caudas na água e a abertura explosiva dos respiradouros dos animais em pânico, até que tudo termina. Especialmente em dias sem vento, é um silêncio aterrador. O som de nenhum som pode ser o mais ensurdecedor de todos.

... e depois.

Não cometa o erro de pensar que é uma tradição honorária ou que se trata de uma cultura alimentar que precisamos respeitar. Não conclua ser apenas pescadores pobres lutando para sobreviver. É um mercado de escravos. O motivo é dinheiro grande. O dinheiro pago por campos de concentração de golfinhos de todo o mundo por golfinhos frescos, pois a maioria dos golfinhos não duram muito em cativeiro. Dinheiro que foi reunido, pois pessoas pagam para visitar esses circos marinhos, para ver golfinhos escravizados fazerem truques bobos em troca de comida. Se você visitar lugares como o Sea World, ou se participar em programas de nadar com golfinhos em cativeiro, você estará mantendo essa indústria funcionando e o mercado de golfinhos escravos continuará vivo. O mercado de golfinhos vivos faz o massacre em Taiji possível e lucrativo.

Na última temporada, os golfinhos foram mortos esfaqueados por uma haste de metal na direção da espinha dorsal. Isso os paralisa, mas nem sempre os mata. Cada dia de massacre, vimos golfinhos arfando por seu último suspiro enquanto eram puxados por uma corda amarrada à cauda até o matadouro, afogando-se no caminho.

O risso é um predador de topo de cadeia alimentar, vivendo de peixe, polvo, lula e krill. Embora não haja estimativas de sua população e, portanto, não se saiba nada sobre o seu estado de conservação, eles foram registrados de 60N a 60S e mantêm uma grossa camada de gordura para se manterem quentes nestas águas frias. A combinação de um animal topo de cadeia alimentar que precisa de isolamento com gordura é crítica. Os poluentes que têm sido bombeados no ar e nas vias aquáticas desde a revolução industrial tendem a armazenar-se na gordura corporal em altas concentrações, quanto mais para o alto da cadeia alimentar e quanto mais longa seja a vida do animal. Essa é a origem de um dos crimes cometidos em Taiji. A carne de golfinho é cortada em bifes, a gordura é frita e ambas terminam nas prateleiras do supermercado e, até pouco, nas merendas escolares. O governo que permite que o povo seja envenenado, seja por ignorância ou por negação, é criminoso.

Muito embora o fundador da Sea Shepherd, Paul Watson, o coordenador da campanha chamada Paciência Infinita, Scott West, e todos os voluntários Guardiões da Enseada tenham se comprometido a seguir as leis japonesas enquanto estiverem no Japão, as autoridades interpretam aquilo que está dentro da lei da sua própria maneira. Uma mentira de um treinador de escravos, a incompetência policial e de promotores, e toda a vontade geral de ter alguém com as cores da Sea Shepherd sob custódia, levam por fim a uma rara e embaraçosa liberação e indenização por uma prisão errada, que foi toda para apoiar a campanha deste ano dos Guardiões da Enseada.

Embora todos os apoiadores paguem por seu próprio transporte, refeições e acomodações, existem custos, como o aluguel de carros, gasolina, rádios e outras comunicações. Sendo assim, doações são bem-vindas. Que fique claro que nenhum de nós gasta nem um centavo no povoado de Taiji consigo.

Precisamos fazer isso acima de tudo! Precisamos de pessoas equilibradas, compassivas, corajosas e dedicadas para estarem em campo em Taiji. Quantas mais, melhor! Porque estamos fazendo a diferença! Não só diminuíram os números de golfinhos mortos, mais e mais pessoas ficam sabendo sobre Taiji e sua conexão com os parques marinhos ao redor do mundo. Sob essa influência e pressão local, alguns desses parques estão fechando na Europa e em outros lugares. Como em outras campanhas, quando não conseguimos atingir seus corações, ainda podemos fazer a campanha dar prejuízo aos seus bolsos. Se não compreendem compaixão, eles devem entender de economia.

Quer ser um Guardião da Enseada? Escreva para nós em: [email protected]

Traduzido por Carlinhos Puig, voluntário do Instituto Sea Shepherd Brasil