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Piscosos na medida provisória do Ministério da Pesca são os empregos públicos criados

Difícil é supor que com mais caniço e samburá se vá aumentar até 2011 a estagnada produção de pescado
Antonio Machado

Nem que estivesse com a vida ganha seria defensável a perda de tempo do governo com assuntos secundários, de interesse apenas dos sujeitos contemplados, como a promoção da Secretaria da Pesca a Ministério que até um aliado insuspeito, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, cardeal do PT, refugou – se não o ato em si, a forma empregada: uma medida provisória, o que pressupõe urgência, impossível de existir para uma estrutura com seis anos de vida.

De benefício da decisão não se pode nem alegar a fábula bíblica da multiplicação dos peixes, embora o presidente Lula, sempre de olho no eleitorado simples e mestre na arte de transmutar medidas de alcance tão curto quanto uma vara de pescar em transcendentes decisões sociais, tenha anunciado uma “reforma aquática”, similar à agrária, graças ao novo Ministério. Conversa de pescador.

A Secretaria da Pesca foi criada em janeiro de 2003 para acomodar a facção catarinense do PT, uma das muitas correntes do partido. O atual secretário, Altemir Gregolin, veio direto da administração petista de Chapecó. A intimidade com a pesca não é maior que a de Lula, pescador de fim de semana. Mas isso é de menos, até o título de ministro, status existente desde o nascimento da Secretaria.

O que há de piscoso na medida provisória – que o governo cogita retirar do Congresso, se constatar que o mar não está para peixe, para eventualmente reintroduzir como projeto de lei com pedido de urgência de votação -, são os empregos públicos criados: para começar, a pasta teria mais 350, 150 para preencher sem concurso. Coisa para bagres gordos e vistosos, não humildes lambarizinhos.

Difícil é supor que com mais caniço e samburá se vá aumentar até 2011, meta anunciada por Gregolin no dia em que Lula comunicou sua decisão de promover a Ministério a Secretaria da Pesca, a produção de pescado no país. Ela está estagnada em 1 milhão de toneladas há anos, “uma vergonha”, segundo Lula. Se em seis anos a produção não cresceu, por que cresceria agora, faltando pouco mais de dois anos para o governo terminar? Haja minhoca na ponta dos anzóis.

Apagão estatístico

Aliás, a própria estimativa está estagnada, já que, como se apura no site da Secretaria, o número mais recente é de 2005, da época em que o Ibama cuidava da atividade. O que se fez nos seis anos da Secretaria? Pelo que se encontra no mesmo site oficial, não parece que foi muita coisa.

Em 2006, a balança comercial do setor deixou um déficit de US$ 76 milhões, com exportações miúdas de US$ 351,5 milhões. Para 2007 os dados divulgados só vão até abril, quando já acumulava déficit de US$ 152 milhões.

As estatísticas de produção são de três anos atrás, quando qualquer atividade que se preza sob amparo de um ministério, como turismo, tem números mensais. Sobre a parte de aqüicultura os dados mais recente são de 2001.

Mas o gasto é preciso

A medida do setor de pesca no país é precária, mas já se sabe na ponta do lápis, neste estranho planejamento, quantos funcionários empregar e quanto gastar. O ministro Gregolin anunciou uma linha de crédito de R$ 1,5 bilhão, com prazo de 18 anos e juros de 7% e 12%, para equipar uma frota oceânica de pesca.

Isso quando dados também não muito recentes do Ibama falam de esgotamento de várias espécies pela pesca predatória. Já há também, e se cogita ampliar, vários programas sociais para a pesca artesanal.

História desastrosa

O país já conheceu o desastre da Sudepe, a Superintendência de Desenvolvimento da Pesca, que ao ser extinta, no governo Sarney, deixou um brutal passivo de frotas movidas a créditos subsidiado.

As coisas não acontecem por acaso. Acompanhe-se o movimento dos estaleiros interessados, onde estão, quem defende a iniciativa, e se chegará à motivação de reativar uma atividade importante para vários países, fundamental para a dieta da sociedade, mas que só fica de pé se antecedida de um plano técnico exaustivo.

Não se irá longe, sem se avaliar os problemas ambientais e se há potenciais empresários com know-how e capital próprio dispostos a investir no ramo. A pesca artesanal, que responde por quase 80% da produção, está no limite e depende para crescer de infra-estrutura de terminais, frigoríficos e transporte.

Só com subsídios não se constrói um negócio essencialmente privado. Nem com um Ministério e centenas de cargos públicos comissionados.

Um passeio ao acaso

O mesmo governo ágil para criar novas estruturas e abrir vagas em que os salários serão muito maiores que os possíveis na iniciativa privada é inepto para destravar questões simples, como o nó em que se transformou a ampliação dos recursos requeridos pelo BNDES para atender a enorme demanda por investimentos, sobretudo os do PAC.

O dinheiro há. Está parado na CEF. É do FGTS. São R$ 17 bilhões, dos quais só R$ 2 bilhões aplicados em infra-estrutura. O Tesouro deu a solução: destinar uma parte ao BNDES. A CEF propôs R$ 7 bilhões. Depois recuou. Dois ministros, Dilma Rousseff e Guido Mantega, não conseguiram desfazer esse nó.

Mas, afinal, não é tudo governo? Ou virou passeio ao acaso? Falta decisão de quem pode decidir.

Fonte: Cidade Biz

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