Editorial

Mais sobre a caça científica

Comentário por Sidney Holt, membro do Conselho Consultivo da Sea Shepherd

Dr. Sidney Holt. Foto: Tim Holt

As audiências de hoje, 10 de julho de 2013, em Haia, na Corte Internacional de Justiça, no caso (pesquisa científica) da caça de baleias, em que a Austrália está acusando o Japão, foram fascinantes, mas talvez obscuras para alguns espectadores do webstream ao vivo da ONU.

Elas eram principalmente sobre como o Japão havia calculado as amostras “necessárias” da captura de carcaças de baleias científicas no seu programa de pesquisa na Antártica, JARPA II, que começou em 2005. O governo japonês disse que isso foi decidido com base em necessidades de análises estatísticas válidas. O Dr. Lars Walloe, um cientista que trabalha para o governo da Noruega, mas que está servindo neste caso como testemunha científica em nome do governo japonês, tinha dito na última sessão do tribunal que ele tinha olhado para os cálculos do Japão e eles estavam corretos. Em seguida, descobriu-se que ele não podia justificar essa afirmação, e quando pressionado, admitiu que não tinha sido capaz de compreender as razões dadas para a escolha dos números.

No meu primeiro comentário – “Minha opinião sobre a caça científica do Japão na Corte Internacional de Justiça“, escrevi que tais cálculos estatísticos poderiam ter sido feitos porque nenhuma hipótese testável havia sido apresentada pelos japoneses em seus programas JARPA e JARPA II. Eu afirmava que os cálculos tinha, de fato, sido feitos, mas estes cálculos foram os de logística e econômicos: quantas baleias seriam necessárias a cada ano para tornar a caça de baleias-minke na Antártida viável, se não intrinsecamente rentável, e como obter a carne de volta para o Japão imediatamente.

A grande questão na audiência foi: por que o número para o programa original curto, chamado JARPA – que era de cerca de 400 baleias-minke por ano – saltou para uma “necessidade” em dobro – 850 no JARPA II, a partir de 2005. Eu escrevi que o aumento tinha sido necessário porque o custo original de mover o navio-fábrica e os seus barcos coletores de e para a Antártica, e os cálculos de vendas de carne, estavam errados. Um navio-fábrica envelhecido requer grandes reparos, a Organização Marítima Internacional impôs novas regras para os navios que operam no Oceano Antártico, o preço do combustível subiu, e as vendas de carne não foram tão boas quanto o esperado. Tudo isso é verdade.

Mas, então, por que exatamente 400 de repente saltar para 850?

Agora eu posso dizer que as razões eram inteiramente operacionais. O navio-fábrica, o Nisshin Maru, é bastante pequeno, tanto quanto os modernos navios-fábricas baleeiros. Quando isso acontece, ele pode processar, congelar e transportar a carne e alguns outros produtos de cerca de 400 baleias-minke.

Durante o JARPA percebeu-se que uma captura maior seria necessária no futuro, para cobrir o aumento dos custos e a necessidade de atrair subsídios maiores. Havia a esperança de que o mercado poderia ser expandido para ter mais carne, e grandes esforços foram feitos para garantir isso. A solução para o problema logístico seria mandar para outro navio, com capacidade frigorífica suficiente para ir para a Antártica no meio da temporada, para que a carne já no porão do Nisshin Maru fosse transferida no mar a este navio e levado para o Japão, enquanto que o Nisshin Maru iniciaria suas operações de processamento de baleias novamente. Isso representa o dobro de capturas de uma licença especial.

Uma vantagem adicional desse transbordo era que o navio – navegando sob uma bandeira de conveniência, é claro – devidamente instalado, poderia trazer óleo combustível para abastecer os barcos coletores no meio da temporada. Os portos na Austrália, Nova Zelândia, África do Sul, Chile e Argentina não eram suscetíveis de estarem disponíveis para esta finalidade (um problema surgiu quando a Organização Marítima Internacional fez uma nova regra que proibiu o reabastecimento de navios no mar em águas da Antártida). O Nisshin Maru – e, talvez, os coletores, também – que, no futuro, terão que se mover para o norte, fora da Antártica, para operações de reabastecimento no mar.

Um ponto importante no caso da Austrália – que a caça do JARPA II não é para o objetivo principal da pesquisa científica, conforme previsto na Convenção Internacional para a Regulamentação da Pesca da Baleia de 1946 – é a de tempo. Programas de pesquisa reais têm também datas de início e fim. Mas o JARPA II não tem prazo. A intenção era continuar até que a moratória sobre a caça comercial de baleias fosse suspensa, independentemente de quando possa acontecer.

Ao longo da audiência, representantes do Japão têm tentado convencer o tribunal de que a moratória, adotada em 1982, que entrou em vigor em 1986, era parte de um plano maligno pela Austrália para transformar a Comissão Internacional da Baleia em uma organização anti-caça às baleias. Na época, a Austrália tinha acabado de se tornar uma nação não-baleeira. Ela fazia parte de um pequeno grupo de membros da Comissão Internacional da Baleia, que adotaram políticas de oposição à caça comercial.

Com essa nova política vigorosa, não foi fácil para a Austrália, como uma nova nação não-baleeira, apoiar, e certamente não assumir a liderança para o movimento geral para a adoção de uma moratória sobre a caça comercial por 10 anos, originalmente proposta pela ONU. Até então, a maioria das nações que desejavam uma moratória – uma clara maioria dos membros da Comissão Internacional da Baleia – acreditava que uma “pausa” internacional sobre a caça devia começar, por tempo indeterminado (embora sujeita a revisão após um determinado tempo), por boas razões práticas. Os cientistas queriam dar tempo para as populações de baleias, para mostrar, pelo menos, o início da recuperação do esgotamento, em 10 anos, pelo menos. Os cientistas não estavam em condições de dizer quanto tempo, mas dez anos parecia muito pouco.

As propostas da moratória da caça comercial a partir de 1978 receberam amplo apoio e cada vez maior, porque era mais claro do que nunca que a informação científica é insuficiente para suportar a operação de um procedimento de gestão para a caça adotada pela Comissão Internacional da Baleia, em 1974, na sequência das propostas da ONU. A falha dos procedimentos de gerenciamento ofereceram uma alternativa a uma moratória e tinha sido desenvolvido e proposto à Comissão Internacional da Baleia pelo governo da Austrália, quando ele ainda era um país baleeiro, com uma política pró-caça comercial agressiva.

Traduzido por Raquel Soldera, voluntária do Instituto Sea Shepherd Brasil